UMA CARTA PARA U
- Rita Escórcio
- 22 de set. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 11 de out. de 2024

U,
agora , certamente, você entenderá pouca coisa do que aqui está escrito., mas o tempo, grande mestre, encarregar-se-á desta tarefa.
Estamos em pleno século XXI…
A televisão noticiou que, no estado do Rio de Janeiro, o governo abriu, solenemente, a temporada “Caça a um Pai”.
Milhares de mulheres enfileiravam-se munidas de poderosíssimas armas. Os pobres animais, acuados, puseram as barbas de molho, ou melhor, a genitália e, alguns deles preferiram a “castração”, temendo que a temporada vire moda e que fiquem para sempre na mira das caçadoras. Eles optaram, através da vasectomia (intervenção cirúrgica utilizada para a esterilização do homem) não mais procriarem, pois o escudo que eles possuem é muito frágil e incômodo: a camisinha (preservativo masculino). Este preservativo afeta a masculinidade de muitos machos. Para eles é preferível correr o risco da contaminação do que adquirirem filhos indesejados. Então, “Viva a Vasectomia!” e “Abaixo a Camisinha!”
“Caça a um Pai” também promove o aparecimento dos alheios: pessoas que querem estar em evidência e têm, como tarefa, o direito de difamar, condenar e apedrejar as caçadoras (os apresentadores/apresentadoras de programas de auditório). Os alheios julgam apenas o comportamento copulativo do macho e da fêmea sem levar em consideração a vida que foi gerada. Diz o adágio popular que no macho nada pega. Nestes casos, realmente. Já, na fêmea pega tudo, principalmente filho. Parafraseando Shakespeare: “ter ou não ter, eis a questão”. Não ter é a valorização do presente; significa liberdade; novos relacionamentos e, talvez, futuramente, arrependimentos. Ter é a opção mais dura, mais difícil e a mais prazerosa, também a mais vilipendiada.
O vilipêndio começa quando uma mãe recorre à justiça. A mulher atravessa, literalmente, um calvário. Começa por andar em cima de uma tartaruga. Apesar de detalhar com pormenores todo o relacionamento, a mãe não evita o achincalhe por parte de toda a sociedade. No fim do século/milênio passado, surge o exame de DNA, possibilitando uma aceleração no passo dessa tartaruga. O resultado positivo no exame não cumula de afeto, carinho e companheirismo o beneficiário. É uma pena! Em torno de si, desperta marcas de ódio e rancor. O homem, agora pai, se sente torturado por ter sido agredido em seus brios: o bolso. E, consequentemente, rejeita o filho gerado sem planejamento, ou seja, o intruso, o bastardo.
A mulher que, por orgulho ou determinação, não se torna caçadora, lega ao filho um estigma que a própria justiça se encarregava de oficializar: o execrável ignorado em seu primeiro reconhecimento como cidadão na certidão de nascimento. Daí por diante, toda a documentação seguia o mesmo ritual – ignorado, ignorado, ignorado e ignorado. Era um estigma hereditário, pois os filhos de pais ignorados, avós ignorados tinham. Na atualidade, esse estigma caiu em desuso.
Por tudo isso, não encontro razões para perseguir um pai – o doador do espermatozoide que possibilitou o seu nascimento. Ele não merece ser tão valorizado assim, pois de um homem que se recusa a lhe dar carinho, que o dinheiro que ele tem também não sirva para lhe dar alimento. A propaganda de um gel massageador que responda por nós: ”não basta ser pai, tem que participar,”
Sei que todo o amor que dedico a você não será suficiente para suprir suas carências. Um dia, você irá cobrar-me a presença de um pai em sua vida... Neste momento, vou ter duas histórias para lhe contar. A primeira, de um atleta muito famoso que enxota a filha, apesar de ela ter judicialmente a paternidade reconhecida. Ele pisoteia em cima da mãe da moça, renegando os momentos de prazer que um dia já lhe proporcionara. É um canalha! A segunda, de um cantor também famoso que buscou, incansavelmente, encontrar o pai antes da fama. Quando o sucesso chegou, vários homens se apresentaram como sendo seu pai. Tarde demais!
U, a mim resta, agora, mesmo que você não entenda a profundidade desta palavra/sentimento, pedir-lhe perdão. É o que faço quase sempre:
- Perdoe-me por tê-lo amado sozinha.
Rita Escórcio
(Mãe Solo)